segunda-feira, 23 de julho de 2007

Um dia acordei...


Um dia acordei, ou não, não tenho a certeza se estou acordada... Sinto-me confusa, perdida e sem rumo. Sinto uma vontade imensa de fugir, não sei muito bem de quê, mas sinto-o intensamente.

Acordei, mas não estava adormecida, estava numa latência infinita, sonâmbula, movimentando-me aleatóriamente, flutuando sobre a vida.

Acordei, mas não queria acordar, sinto-me a deambular pelo infinito, mas não sei se estou a gostar. É solitária esta viagem. Procuro algo que não sei se existe. Vivo na insatisfação... Não sei se sou feliz. Vivo num momento irreal. Invento realidades paralelas. Confundo os sentimentos...

Acordei, mas continuo a sonhar, não o consigo evitar... Sonho com o meu mundo perfeito, mas a minha insatisfação não me deixa concretiza-lo. Brinco com a vida, atiro-me de cabeça para o abismo, sem pensar. E caio em mim... Choro, sorrio, rio às gargalhadas, choro, choro, choro... mas choro por dentro, em silêncio, sem ninguém me ouvir. Choro para mim e sorvo as minhas lágrimas como se fossem algo precioso. Transformo-as em força, em impulsos de raiva, de ternura de prazer.
Não compreendo as pessoas, não entendo o mundo, não me percebo a mim própria... Não sei quem sou, nem o que quero ser. Derramo a minha alma por onde passo. Dou-me sem me vender. Dou-me demais. Não aceito nada em troca. Não me vendo.

Acordei, e não quero sentir. Quero perder a sensibilidade. Tenho medo. Não quero crescer... Não consigo... Evito os sentimentos sem os conseguir evitar. Engano-me a mim própria. Enceno para mim uma peça mentalmente concebida, idilica, e represento-a. Não consigo evitar de sentir. Maldita essência que a natureza me deu.

Acordei, com um dilema, o mais enigmático dos dilemas, o de mais dificil resolução, o mais intrincado. A definição da essência do meu ser. O que mudou em mim? O que me fugiu ao controlo? O que me está a fazer sentir desta forma? Eu sei... mas vou negar a mim própria.

Acordei, e sei que vou ter que sobreviver. Eu sou uma sobrevivente por natureza, tal como o naufrago que se salva das águas gélidas do oceano no último momento, e que já não sente qualquer parte do seu corpo, em que só o cérebro está acordado para lhe agudizar a dor e a loucura. Sou eu esse naufrago, revejo-me na sua loucura, na sua dor, no repassar das últimas palavras proferidas. Sou eu esse naufrago, e meu oceano é o mundo, a sociedade que me reprime e me condena. O oceano é aquele dedo sempre para mim apontado... Mas eu sei que vai ser sempre assim... Aí está o meu ser, flutuando no oceano, deixando-se levar apenas por algumas ondas, mergulhando noutras, mas sem se deixar embeber nas suas águas salgadas.

Acordei, e sou eu, revejo-me num gato meigo, dócil, astuto e assustado mas que não consegue evitar a sua natureza. Sou eu, mais uma peça num grande puzzle, que não encontra o seu sitio. Não estou a conseguir elevar a minha alma. Dá-me dois minutos... Não chega... talvez mais dois... Talvez um banho bem quente para diluir as lágrimas mornas que me deslizam pela face sem freio... Sim, isso deve resolver a angústia que sinto em mim.

Acordei, e já chega de me lamentar. Não, não é por comparação que resolvo as minhas “desgraças”. Não penso que o mal dos meus congéneres é pior que o meu. O meu é o pior porque sou eu que o sinto, da minha forma. É meu, pessoal e intransmissivel. Por isso vou exorcizá-lo à minha maneira... Pois já sei e criar outro problema maior... Paciência. Sou eu... e eu sou assim...

2 comentários:

naoviraraocontrario disse...

De verdades assim sentidas, espero que nunca as ocultes nem fujas. Belíssimo este sentir...Belíssimo este acordar...
Ao ler-te na tua angústia, fizeste-me sorrir e sentir o naufragar.

Nuno disse...

O acordar...O acordar que todas as manhãs nos faz lembrar que somos vivos. O acordar que montes de vezes nos levam ao desespero duma realidade, duma confiança, duma paixão. O querer e não ter é o que nos faz desesperar, porque depois de ter, o não ter já deixa de existir. São estes os acordares daqueles que sobrevivem às cidades, que sobrevivem a tudo os que os rodeia e que os deixa confusos e sem rumo mental para pronunciar o que quer que seja. Não exitem mundos paralelos, mas sim mundos de refúgio onde nos escondemos para não sermos vistos, para não sermos abordados e para nos esquecermos do que não temos.
Sentimentos que nos confundem, sonhos que nos criam a ilusão da realidade, confusão, montes de confusão. Mas é isto que caracteriza o espirito humano, e é esta a nossa essência.
Leio palavras soltas, sentidas e sofridas. Mesmo assim, há sempre um momento calmo mesmo no mar mais revolto, e é esse mar calmo que devemos aproveitar e nele navegar...